‘Casas fantasmas’ assombram um Japão que envelhece rapidamente
Com mais de 20% de sua população com 70 anos ou mais e a taxa de natalidade em declínio, o Japão tem um problema: há mais casas do que pessoas para morar nelas.
Em 2013, havia 61 milhões de casas e 52 milhões de famílias, de acordo com o Japan Policy Forum. E a situação tende a piorar. A população do Japão deverá diminuir de 127 milhões para cerca de 88 milhões até 2065, de acordo com o Instituto Nacional de População e Previdência Social, o que significa que daqui algumas décadas ainda menos pessoas precisarão de casas.
À medida que os jovens deixam as áreas rurais atrás de empregos na cidade, o interior do Japão se torna assombrado por casas “fantasmas”, conhecidas como “akiya” (空き家).
O declínio populacional têm sido preocupante nos últimos anos. Sendo uma sociedade que envelhece rapidamente, combinada com baixas taxas de natalidade e imigração praticamente inexistente, colocou o Japão no caminho de uma contração populacional significativa.
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Em abril deste ano (2020), o Ministério dos Assuntos Internos e Comunicações informou que o total da população do Japão, apurado até 1.º de outubro do ano anterior (2019), é de 126,167 milhões, 276 mil a menos que na mesma data de 2018. A taxa de redução da população total foi de 0,22%, a maior desde 1950, quando se deu início à coleta de estatísticas.
Prevê-se que até 2040, quase 900 cidades e vilas em todo o Japão estarão em risco de extinção, de acordo com um relatório de 2014 intitulado ‘Extinções Locais’ publicado por Hiroya Masuda. Nesse contexto, doar uma propriedade é uma tentativa de sobrevivência.
Embora o maior impacto esteja nas cidades rurais, o problema também afeta áreas próximas a metrópoles. É o caso de Okutama, uma das três cidades da prefeitura de Tóquio que podem desaparecer até 2040, segundo Kazutaka Niijima, funcionário do departamento de Revitalização da Juventude de Okutama (OYR), um órgão do governo criado para repovoar a cidade.
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Em municípios por todo o Japão, existe um número crescente de casas esquecidas e dilapidadas conhecidas como “Akiya” (空き家) ou “casas fantasmas”.
Para agravar a situação, as prefeituras rurais com taxas de natalidade mais altas perdem residentes para metrópoles, mas com baixa taxa de natalidade, como Tóquio e Osaka. Esse duplo golpe contribuiu para a taxa de natalidade cronicamente baixa do país, colocando o país no caminho de uma perda projetada de um terço de sua população até 2065.
À medida que os residentes mais velhos de uma cidade se mudam para casas de repouso ou falecem, suas casas passam para seus herdeiros. As gerações mais jovens, agora cada vez mais localizadas nas principais cidades do Japão, muitas vezes não têm interesse em herdar ou manter a casa ancestral da família no interior, nem de arcar com os impostos de propriedade exigidos. Em outros casos, os funcionários não conseguem localizar ou identificar os herdeiros adequados, deixando o destino da propriedade em um estado de abandono e limbo.
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Como resultado, as casas ficam cada vez mais abandonadas, tornando-se degradadas no processo. Estatísticas do governo em 2018 consideram 13,6 por cento das propriedades no país como casas fantasmas. Dito de outra forma: em 2040, estima-se que o tamanho total das propriedades abandonadas no Japão seja igual ao tamanho do território da Áustria.
Isso representa um desafio para os governos locais sobre como lidar com essas propriedades. Em contraste com outros países, a lei japonesa não permite aos municípios um direito rápido de domínio eminente, deixando-os, em vez disso, tentando rastrear e negociar com herdeiros ausentes. Onde a lei local autoriza uma cidade de demolir casas abandonadas, os municípios muitas vezes recusam o custo associado, deixando as estruturas da maneira como estão.
Para Daishiro Kitayama, a rapidez é essencial para encontrar compradores para casas fantasmas antes que suas condições se deteriorem. “É necessário tentar vender assim que [uma casa] ficar vaga”, disse Kitayama, presidente do Centro de Apoio à Cidade Natal sem fins lucrativos, que trabalha em encontrar compradores na província de Fukui, região de Chubu.
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“Os custos de reforma são inevitáveis na compra de uma casa Akiya”, diz ele, sendo esses custos frequentemente citados como uma barreira significativa para os compradores em potencial. Esses custos, no entanto, podem ser substancialmente reduzidos se a casa for comprada antes de ser deixada ociosa e sem cuidados por um longo período.
Convencer os compradores, no entanto, é um desafio difícil, levando as cidades a pensarem em soluções criativas com o objetivo de resolver a questão das casas abandonadas e o declínio do número da população. Uma delas é o oferecimento de atraentes subsídios.
Na cidade de Toyoshima-ku, em Tóquio, o governo local adotou uma política de subsídios de 100.000-200.000 ienes para a reforma. Na província de Hyogo, subsídios de até metade do custo de uma reforma básica estão disponíveis para quem atender os requisitos.
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Projetados para encorajar jovens residentes a comprar casas fantasmas indesejadas, esses subsídios geralmente exigem que os proprietários vivam e mantenham suas casas por um determinado período antes de se qualificarem a ficarem com elas definitivamente.
A cidade de Okutama, localizado a apenas duas horas de Tóquio, ganhou as manchetes internacionais em 2018 depois de doar casas fantasmas a um custo zero, desde que o interessando tivesse menos de 40 anos e tivesse pelo menos um filho menor de 18 anos.
Algumas cidades, como Yokosuka, nos arredores de Tóquio, operam sites dedicados a anunciar casas fantasmas, com propriedades vendidas por apenas US$ 5.400. Na província de Gifu, as autoridades locais negociam a doação de casas fantasmas para os municípios, sendo mantidas por funcionários da cidade e revendidas com o objetivo de atrair os residentes mais jovens.
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Um site até lista propriedades fantasmas à venda sem custo, embora, como as fotos indicam, muitas vezes o comprador terá que gastar o preço de uma casa nova com a reforma.
Para compradores como Hideo Katagata, a chance de comprar uma casa fantasma é uma oportunidade boa demais para ser perdida. “Foi na época em que eu estava pensando em me mudar de qualquer maneira”, escreveu Katagata, “então, quando fui ver a propriedade, imediatamente decidi [comprá-la] porque gostava da atmosfera da área e da casa.”
Katagata, que comprou sua casa em uma área remota da província de Miyagi, admite que houve desafios na reforma de sua casa fantasma, incluindo danos causados pela água em vigas e colunas de madeira, bem como colônias escondidas de temíveis centopeias mukade.
Mas ele também cita uma série de aspectos positivos de possuir uma casa fantasma: “Você pode personalizar [a casa] de acordo com seu próprio estilo e, ao mesmo tempo, fazer o melhor uso da estrutura antiga.” No entanto, Katagata é uma exceção, já que a maioria das pessoas no Japão preferem investir em uma construção nova a ter que reformar uma casa Akiya.
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