A beleza e a simbologia do musgo no Japão
Devido à sua prevalência na nação insular, o musgo está profundamente enraizado na cultura japonesa. Conheça um pouco da sua importância e seu significado
Na cultura japonesa, o musgo representa conceitos de beleza, simplicidade, humildade e requinte, assim como a estética do wabisabi – transitoriedade e imperfeição. Em todo o Japão, o musgo é abundante na natureza, bem como em jardins bem cuidados, templos e museus – que são o foco de passeios populares para observação de musgo.
Pra você ter uma ideia, o musgo também é inclusive mencionado no hino nacional do Japão, “Kimigayo”. Para muitos de nós, o musgo pode ser quase imperceptível mas os japoneses há muito admiram essa planta que ama a umidade por sua beleza sutil e melancólica.
A abundância é um fator central na centenária paixão japonesa por musgo. Alimentado pela umidade das monções do Leste Asiático, o clima chuvoso do Japão oferece um ambiente ideal para o florescimento das mais de 1.700 variedades de musgo do país.
Muitos escritores japoneses ao longo dos tempos buscaram na planta para expressar aspectos da condição humana, cunhando frases como kokemusu (para se tornar coberto de musgo) para transmitir a passagem lenta do tempo e o idiomático koke no koromo (vestimentas de musgo) para descrever as vestes ásperas e sem adornos de um sacerdote budista.
A classe guerreira do Japão encontrou uma metáfora poderosa para a transitoriedade da vida nas flores de curta duração da cerejeira, mas o musgo também forneceu uma lembrança sombria do destino inevitável de todos os seres vivos, conforme expresso no ditado koke no shita (abaixo do musgo), indicando que uma pessoa foi para o túmulo.
Os aristocratas japoneses do período Heian (794–1185) apreciavam a beleza do musgo, mas ele só passou a ser valorizado a partir da proliferação da cultura Zen no século 14.
Monges zen budistas encontraram serenidade no musgo e, ao longo dos séculos subsequentes, designers de jardins o usaram para produzir paisagens memoráveis, enquanto escritores japoneses usaram musgo como uma metáfora para a passagem do tempo, longevidade, mortalidade e muitos outros aspectos importantes da condição humana.
O musgo passou a ser usado de maneiras diferentes conforme a estética Zen amadurecia. Um jardim pode ter uma cobertura de musgo semelhante a um tapete, como no Saihōji, pequenas manchas colocadas seletivamente para representar características naturais como uma ilha flutuando na água, ou tapetes formados em formas geométricas ousadas.
Desde então, a admiração do Japão pelo musgo tem crescido a cada ano. Dando um passeio pela vizinhança, não é incomum ver musgo em forma de esferas chamadas kokedama. Essa bola de musgo, de alto valor estético, pode ser usada para cultivar diferentes espécies de plantas, embelezando tanto jardins externos como o interior das casas.
Em 2011, o livro de Hisako Fujii “Mosses, My Dear Friends” vendeu mais de 40.000 cópias. Em um ensaio , a autora relembrou a primeira vez que se apaixonou pela planta, durante uma viagem à Ilha Yakushima, no Japão:
“Como um tesouro intocado de outra época, o musgo parecia estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Tinha coberto completamente as árvores, as pedras e até o chão, envolvendo toda a floresta em seu pelo verde luminoso … Isso, pode-se dizer, foi o início do meu caso de amor com o musgo.”
O livro ajudou a desencadear uma nova onda de tours de visualização de musgo, onde os visitantes inspecionam as plantas com lentes de aumento. Surgiram também bebidas com tema musgo e anéis que germinam musgo em vez de joias (marimo), entre outras coisas.
O amor e a obsessão do Japão pelo musgo criou até uma tribo nascente de fãs obstinadas que se autodenominam “Moss Girls” ou “Meninas musgo”, excursão com um grupo de mulheres que visitam locais específicos, famosos para a visualização de musgo.
Alguns locais mais procurados para apreciar o musgo no Japão incluem o famoso jardim do Templo Saihō-ji em Kyoto (que contém cerca de 120 tipos diferentes de musgo e faz parte do Patrimônio Mundial da UNESCO); o jardim do Museu de Arte de Hakone na Prefeitura de Kanagawa; Templo Koto-in e templos Tōfuku-ji e Sanzen-in em Kyoto (onde quadrados de musgo e pedra criam um desenho xadrez chamado de padrão Ichimatsu).
Tem ainda a “vila de musgo” de Koke no Sato em Hiyomachi; e o jardim japonês em Ryōtanji na província de Shiga (onde o musgo representa ilhas e montanhas). Esses são apenas alguns dos locais onde você vai poder apreciar o musgo japonês em toda sua plenitude.
Como podemos perceber neste artigo, o musgo está profundamente enraizado na cultura japonesa. O clima úmido do Japão cria as condições perfeitas para a planta prosperar, e olhar para o musgo durante os verões quentes e úmidos do Japão pode realmente ter um efeito relaxante (uma razão pela qual muitos penduram bolas de musgo sob os beirais de suas casas).
Nas culturas ocidentais, as pessoas freqüentemente verão a natureza como algo a ser conquistado. Mas, em vez de tentar dominar a natureza, os japoneses procuram conviver com ela, abordando o mundo natural com a atitude de um hóspede educado.
Embora em muitas culturas, o musgo possa parecer insignificante, no Japão há um desejo inerente de preservá-lo e muitos japoneses não imaginariam destruir algo tão inócuo. Para os japoneses, não é um caso de amor que provavelmente desaparecerá em poucos anos. Assim como a própria planta, esse amor é duradouro e se estenderá por gerações.
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