Yasu e Kazumi


YASU E KAZUMI

Conheça a história de um casal apaixonado que atravessou uma existência inteira longe, mas, ao mesmo tempo, muito perto.

Por Mara Vanessa Torres & Rafaela Torres

Japão, Era Sengoku.

O céu estava tingido de vermelho. As águas tinham gosto de sangue e o ar era pesado, denso. Nesse período de intensa turbulência, caos, instabilidade e guerras sem fim, nasceu um amor improvável.

Yasu pertencia ao clã Yamana. Dotada de muitos talentos, Yasu também possuía grande beleza exterior e interior. Seu destino estava selado desde o nascimento: casaria com um influente samurai do clã.

A vida teria seguido seu curso normal se Yasu não tivesse conhecido Kazumi, membro do clã Hosokawa. Rivais por questões alheias aos seus corações e suas vontades, Yasu e Kazumi tentaram resistir ao sentimento que começaram a nutrir desde a primeira troca de olhares, ocorrida por puro acidente e ocultada por ambos.

Eles sabiam que jamais poderiam ficar juntos. O ódio e a rivalidade imperavam entre seus clãs, sedentos por controle e poder. Se fugissem, acabariam presos e decapitados, e suas cabeças enfeitariam a entrada dos feudos para servir de lição. Suas famílias não escapariam à carnificina e seriam dizimadas.

As ruas de Kyoto estavam liquidadas pelas constantes batalhas e, durante esse período de lutas e sangue, não havia um dia sequer de paz. Mesmo assim, Yasu e Kazumi guardavam em seus corações a força e a resiliência, alimentando a certeza de um amor eterno.

* Remembrace por Madeleine (Saper Lipop)

Como previsto, Yasu casou-se com um prestigiado samurai do clã Yamana. Todos os dias, assim que abria os olhos, a imagem de seu amado Kazumi inundava sua mente, trazendo um pouco de serenidade ao seu coração.

No verão, Yasu e Kazumi sentiam o calor do sol em suas peles, imaginando que, naquele instante, eles estavam juntos. Assim que a neve salpicava as montanhas japonesas e o frio invadia as casas, o casal se conectava através da vastidão de gelo que seus olhos vislumbravam.

Durante o outono, o vento que acariciava o rosto de Yasu era o mesmo que tocava a nuca de Kazumi. Na primavera, a beleza do desabrochar das flores os fazia esquecer a cruel separação que lhes era imposta.

Mesmo com as consecutivas ameaças de morte, Yamana Yasu mantinha o amor vivo em seu coração. Nada lhe causava pânico ou medo. Ainda que cumprisse suas obrigações como esposa, mãe, filha e membro do clã, era o rival Hosokawa Kazumi que mantinha acesa a chama de sua existência.

Em seus pensamentos, ela recitava:

O mesmo gelo que mata o verde das montanhas é o fogo que queima em meu coração. Que meus pés nunca esqueçam onde encontrar os seus.

Lutando ao lado dos samurais de seu clã, Kazumi nunca deixou de pensar em Yasu um dia sequer. Mesmo distante e impedido de ter ao seu lado a mulher amada, o guerreiro dos Hosokawa jamais permitiu que nenhum sentimento exterior, nem mesmo o orgulho de sua família, maculasse o que ele nutria por Yasu.

Nas noites de lua cheia, no mais absoluto silêncio, ele cantava para si mesmo:

Anata hitori janai. Que o outono leve para a minha amada o calor de minhas mãos.

Os anos se passaram. Os séculos também. Com eles, a sangrenta Era Sengoku se dissolveu. Os túmulos de Yasu e Kazumi viraram poeira no tempo, mas o amor deles continua vivo em toda manifestação de sentimento verdadeiro que surge em cada um daqueles que sabem reconhecer e valorizar relacionamentos valiosos.

Anata hitori janai. Você não está sozinho(a).


Mara Vanessa Torres é escritora, jornalista, revisora e crítica cultural. Tem profunda admiração e crescente interesse pelo universo artístico e cultural nipônico. @abyssal_waters

Rafaela Torres é escritora, psicóloga, ilustradora e gamer. Apaixonada pela cultura asiática. @rosenightshade

Imagem do topo: Finest Moments por Bright Light NSH

2 Comentários

  1. Marie

    Eu não tenho palavras para descrever o quão maravilhoso é esse conto! Amei!

  2. Fátima

    Apaixonante, parabéns!

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